Até onde a história da impressionante superação individual de um homem com limitações físicas extremas, pode se tornar material rico à linguagem cinematográfica, sem cair nas perigosas e sedutoras armadilhas dos dramalhões lacrimosos ou dos exageros estereotipados? A resposta é fácil... Colocar lado a lado a mão forte e precisa de um diretor acostumado a temas cascudos e o talento de um ator capaz de mergulhar no universo que permeia cada um de seus personagens como se todos, de alguma forma, fossem partes inalienáveis de si mesmo. Foi a partir desta complexa possibilidade que Jim Sheridan e Daniel Day-Lewis transformaram “Meu Pé Esquerdo” em tudo o que ele é...
E para ilustrar o papel simbólico e desestabilizador desempenhado pela figura de David Bowie sobre a personalidade e a vida de Zac, o quarto filho da outra postagem, fiquem com esta emblemática cena do filme... Nela podemos perceber toda identificação e fascínio causados pela figura de Bowie, assim como o choque e a sua recusa representada na figura de um de seus irmãos mais velhos. Na vitrola ouvimos “Space Oddity”, a clássica canção-título de um dos maiores singles da história do rock. E eu, um fã confesso do ano de 1967, me rendo, com prazer, a força do ano de 1969, que nos deu esta magnífica obra-prima de todos os tempos. “C.R.A.Z.Y.” além de ser um filmaço, possui uma trilha sonora de tirar o chapéu...
Um belíssimo e celebrado filme! Narra a história de cinco irmãos de uma típica família canadense de Quebec durante os anos de 1960 à 1980. Uma família normal em suas virtudes e problemas, se não fosse a andrógena e bela figura de Zachary, o quarto filho, jovem fascinado por David Bowie, que tenta a todo custo mascarar e adequar seus desejos e sua natureza mais íntima aos sonhos e anseios de seu apaixonado e severo pai. A superprotetora e, ao mesmo tempo, opressora presença paterna é o grande fio condutor desta obra que traça um precioso e delicado painel do contundente e revolucionário choque de gerações provocado pelos efervescentes anos 60, representado simbolicamente pelo titânico duelo musical entre Mr. Bowie e Charles Aznavour. Imperdível...
Pegando carona na já longínqua última postagem e ainda me recuperando da furiosa ação do nefasto rotavirus no organismo deste que vos escreve, decidi mergulhar em uma outra vivência babilônica trazida por uma produção cinematográfica... Bem diferente do elemento subjetivo e simbolicamente disciplinador que o termo ganha no ótimo "Babylon" de Franco Rosso, em "Missão Babilônia" o termo em questão está muito mais ligado ao caótico sentido bíblico consagrado em nosso imaginário coletivo. Filme comercial, que segue o clássico modelo, que eu confesso adorar, "ficção científica pós-apocalíptica", é entretenimento total, daqueles que apenas a indústria cinematográfica americana sabe realizar com primazia. Um ótimo remédio para quem está na cama com o vírus preferido da temporada...
Como bem diz a frase do pôster atribuída ao badalado semanário britânico especializado em música e cultura pop, “Babylon” é um filme que deve ser visto... Um profundo mergulho por uma insólita e desconhecida Londres negra, subterrânea, visceralmente retratada pelo olhar de um punhado de personagens tão diversos quanto ricos, que possuem, em sua diversidade, o reggae e a sua negritude como um furioso e pulsante fator aglutinador em meio a uma opressiva ordem hegemônica e disciplinadora. Protagonizado por Brinsley Forde, líder da mítica banda inglesa Aswad fundada nos anos 70, o filme também conta com outros pesos pesados do gênero, como o DJ Jah Shaka e mostra a incendiária ligação do reggae com o punk, união que daria ao mundo toda a fúria do “London Calling” do Clash. Uma viagem intensa e reveladora...
Senhoras e senhores: Com vocês a espetacular e enlouquecida "No Smoking Orchestra"! Comandada por Emir Kusturica, o fabuloso diretor celebrado na postagem abaixo, este projeto segue o rastro de sucesso de seu líder... Uma verdadeira e imprevisível celebração dionisíaca repleta de signos cerimoniais de dança, agito, satisfação, sons e tonalidades. Mesclando sonoridades oriundas dos diversos povos que compõem a colcha de retalhos que cobre as terras dos Bálcãs, a excêntrica banda é a responsável pelas trilhas de alguns importantes filmes de Kusturita, como “Gato Preto, Gato Branco” e “A Vida é um Milagre”. Inserindo todas estas influências à uma atitude e pensamento punk, a “No Smoking Orchestra” tornou-se uma importante ferramenta crítica aos desmandos étnicos e políticos da região...
O filme americano do célebre diretor sérvio Emir Kusturica... Uma definição vaga, se o cineasta em questão não trouxesse em sua bagagem três Palmas de Cannes, um Leão de Veneza, um Urso de Berlim e um estilo estético e narrativo inconfundível, marcado por um humor poético, surrealista e onírico que nos prende do início ao fim de todos os seus filmes. Em “Arizona Dream” não é diferente... Embalado por um estelar elenco comandado por Johnny Depp, Faye Dunaway, Jerry Lewis, Vicent Gallo e Lili Taylor, este título foi o responsável pelo cobiçado Urso de Prata que enfeita sua invejável estante, um delirante duelo entre a vida e os sonhos do jovem Axel, batalha responsável por quem ele se tornará “quando crescer”. Uma escolha sempre repleta de desafios e possibilidades...
Um reencontro com um grande amor do passado que já não via há muitos anos... Assim me senti ao me deparar com Helen Mirren na pele de Elizabeth II em “A Rainha”, filme que lhe rendeu um Oscar e o reconhecimento público de quem ainda não conhecia sua filmografia. Dona de uma carreira cinematográfica discreta, Helen Mirren viveu seus maiores momentos no cinema em um intervalo de quase trinta anos. Para aqueles que não lembram, a distinta e elegante senhora que deu vida à rainha da Inglaterra, é a mesma atriz que interpretou a bela e perigosa Morgana, a sedutora e maquiavélica bruxa de “Excalibur” na clássica versão cinematográfica sobre a saga do rei Arthur, obra que até hoje me fascina a cada vez que assisto. Amor que teima em não findar...
Uma pequena jóia descoberta ao final de 2006... A louca jornada de uma singular família americana que transformou um barato e teoricamente despretensioso filme em uma das mais badaladas e bem sucedidas obras daquela temporada cinematográfica. Ovacionado no “Sundance Film Festival”, a Meca do cinema independente internacional, varou o mundo arrebanhando uma legião de fãs entre aqueles que cultuam o chamado cinema autoral, em uma trajetória tão surpreendente quanto bela. Um típico road movie americano que tem o mérito de trabalhar temas pesados e potencialmente dramáticos sob a luz de um perfeito e arrebatador senso de humor ácido e politicamente incorreto, mandando às favas o sempre chato policiamento moral vigente nos EUA...
A que cheira o século XXI? Esta é a grande pergunta simbolizada no título desta obra... Neste filme, o odor elevado à categoria de obsessão pela extravagância do protagonista, possui muitos mais variados significados do que pode por ventura deduzir uma rápida e superficial olhada. Há tanto de todo fedor e miudezas modernas em cada seqüência de “O Cheiro do Ralo”, que esta obra pode facilmente figurar entre os melhores painéis já produzidos a cerca de nosso tempo pelo cinema nacional. Isso tudo, sem falar no impressionante virtuosismo cênico demonstrado pela interpretação de Selton Mello, o melhor ator brasileiro de sua geração. Este filme é a marca definitiva de sua chegada à uma vigorosa e prolífera maturidade artística. Que venham mais e mais frutos...
O que os fãs do diretor do belo “Baile Perfumado” poderiam esperar como sua segunda obra? Exatamente o lisérgico “Árido Movie”, filme que consolidou definitivamente Lírio Ferreira como um dos grandes diretores de cinema da atualidade, um profundo e conturbado retorno às raízes mais arcaicas de um homem que luta contra aquilo que verdadeiramente é. Dois universos que se chocam violentamente conforme o protagonista percebe o quanto o seu passado ainda é parte latente em sua vida, transformando este road movie sertanejo em uma assustadora viagem no tempo. Viagem com inimagináveis conseqüências tanto para ele, quanto para os amigos junkies que o seguem numa obscura jornada pelo sertão nordestino em busca de diversão e liberdade. Preparem suas malas e entrem nesta louca e imprevisível nave...
É do genial Mel Brooks, o mestre de algumas das mais brilhantes comédias de toda a história do cinema, esta louca saga intergaláctica, que se utiliza de alguns dos maiores clássicos da ficção científica – notadamente Guerra nas Estrelas – para dar vida à uma de suas mais bem sucedidas realizações em toda sua vasta e magnífica obra... O tom acentuada e deliberadamente burlesco, assim como a extravagância nas interpretações do ótimo e afiadíssimo elenco, casam-se perfeitamente para a concepção de um filme efetivamente maior, um grande momento do diretor de clássicos como “Jovem Frankenstein”. E para ilustrar um pouco o descrito acima, fiquem com a fantástica cena que parodia a assustadora e clássica seqüência de “Allien – O 8º Passageiro”. Divirtam-se...
A expressão de cinismo é o seu maior cartão de visitas... Expressão perpetuada no imaginário coletivo como um dos rostos mais famosos do cinema ao longo das últimas décadas. Falar de Bill Murray é se render a um artista que dedicou boa parte de sua carreira à comédias ligeiras que jamais o levariam à algum patamar mais valorizado pela crítica internacional. Entretanto, como quem tem poder de decisão a cerca do real valor de uma obra é o público, estas mesmas obras chegaram ao século XXI com a marca de cult, fazendo com que Bill Murray passasse de um ator caricato para um ator prestigiado pelos círculos mais badalados do cinema autoral. No vídeo, a emblemática cena de “O Feitiço do Tempo”, um dos filmes mais queridos do ator...